Para Classe Média apartamentos e bangalôs, para pobres, casinhas de cachorro
Por: Edilberto Sena
Como explicar os financiamentos da Caixa
Econômica Federal para projetos de moradia em Santarém? O dinheiro é
público, a intenção do governo federal é financiar moradias para milhões
de sem teto do país. Vários prédios e bangalôs vão surgindo e logo
habitados, por quem pode fazer empréstimos pagáveis em tempo
estabelecido. Conjuntos habitacionais para classe média também vão
surgindo e ocupados por quem pode pagar as prestações.
Por outro lado, a mesma Caixa financia
aquele triste cartão postal, ao lado da rodovia que liga a cidade ao
aeroporto, o tal Minha Casa minha Miséria. Um absurdo de humilhação aos
pobres sem teto, uma vergonha para a cidade de Santarém. 2.500 casinhas
de cachorro para famílias pobres, com medidas de 6 metros por sete
metros para sala, quarto, cozinha, lavanderia, para famílias de 4, 5, e
até sete pessoas, como? Não há área para jardim, nem quintal, com três
metros de separação das outras, de frente, de trás e dos lados. Que
equipe de engenharia construiu aquilo? Para cúmulo de ironia e
humilhação aos pobres, cada casinha de cachorro tem um acumulador de
energia solar, mesmo que a temperatura média de Santarém hoje seja de 32
graus C`. Quem permitiu tudo isso? a empreiteira?, a prefeitura?, a
Caixa Econômica?, o Ministério das Cidades? O governo federal? Ou todos
juntos?
Então vem outro absurdo coroando esse
desprezo pelo dinheiro público e os pobres. Desconhecendo a orientação
evangélica que já dizia – “Casa construída sobre areia, vem a chuva, os
temporais e ela cai arrasada...” Assim aconteceu com o projeto Minha
Casa minha Miséria em Santarém: vieram as chuvas, os temporais e o
projeto caiu, as valas partiram as ruas e tudo parou. Desde há mais de
seis meses a vergonha está exposta aos viajantes e aos moradores da
cidade. Tudo indica que o projeto faliu porque foi construído sobre
terreno arenoso. Mesmo que um dia venha a ser concluído, quem aceitará
morar ali? Nem os mais pobres vão aceitar o risco de perderem seus quase
nada com novos temporais.
Até o momento a sociedade não sabe nada
das consequências do desastre, que já era desastre desde a concepção do
projeto em tais dimensões. Ninguém diz nada, não se sabe se alguém será
cobrado responsabilidade. Quem deveria cobrar? O poder público
municipal? A Caixa Econômica, que financiou com dinheiro público? O
Ministério das Cidades? O Tribunal de Contas da União? A justiça
federal? Ou a sociedade santarena, que fica com esse vergonhoso cartão
postal? Quanto recurso já foi gasto com as obras? Quem pagará os
prejuízos? Estas questões todas carecem de respostas, ao menos aos que
se preocupam com a coisa pública. Será que a gerência da Caixa será
incriminada também? Afinal foi ela que liberou o recurso para as
obrinhas.
Enquanto isso, o Movimento de
Trabalhadores em luta por moradia, o MTLM, vem tentando ocupar uma área
improdutiva, bem próxima da área do Minha Casa minha Miséria. Vários
momentos em que a ociosa área de 200 por 2.500 metros é ocupada pelos
membros do MTLM chega o tático da polícia militar acompanhado de um
representante do que se diz dono da área, chega sem mandato de
reintegração de posse e expulsa os ocupantes derrubando os barracos. Um
delegado já chegou a registrar a líder do movimento legalizado como
chefe de quadrilha. Nunca um documento legítimo de propriedade foi
apresentado, mas a o tático obedece ao advogado do que se diz
dono.
Por que dois pesos e duas medidas, uma
sempre contra o povo e outra favorável às elites urbanas? Para os
organizados sem teto chega logo o tático da polícia, já para os crimes
cometidos no caso do projeto minha casa minha miséria, inacabado,
desastrado ninguém toma providência. Certamente porque as autoridades
locais, federais e da justiça não fizeram opção pelos pobres. A opção do
governo federal é o crescimento econômico a todo custo e para os pobres
projetos inconsequentes como este analisado. Mesmo sendo o recurso
usado de modo irresponsável na construção de 3.000 casas em terreno
inadequado, nem o Ministério das Cidades, nem o Tribunal de Contas da
União dá sinal de preocupação. Os milhares de sem teto não sabem quando
e se um dia vão ocupar as casinhas de cachorro, mas os sócios do MTLM
não querem aquilo nem de graça. Um absurdo escandaloso que ninguém
parece se importar.
Edilberto Sena
Coordenador da Comissão diocesana de Justiça e Paz.
O padre tem toda razão se considerarmos o local escolhido e o tamanho do imóvel, realmente não dá pra aceitar um investimento altíssimo pelo governo federal que só beneficiou os donos do terreno.